O Partido dos Trabalhadores e a Regularização Neoliberal no Brasil (2003-2016)
Palavras-chave:
acumulação capitalista, formas de regularização social, classes sociais, neoliberalismo discricionárioResumo
Neste artigo, analisamos como o regime de acumulação contemporâneo busca se regularizar por meio do Estado neoliberal, compreendido aqui como forma histórica fundamental de regularização das relações sociais capitalistas, especialmente durante os governos que assumiram o poder executivo do Estado brasileiro, entre 2003 e 2016. Partindo da teoria marxista dos regimes de acumulação e das classes sociais, buscamos demonstrar que o neoliberalismo neopopulista dos governos petistas não rompeu com os fundamentos do regime de acumulação integral, mas os aprofundou, assumindo formas compatíveis, inclusive, com sua fase de desestabilização. Argumentamos que o neoliberalismo não deve ser compreendido como um modelo ou receita ideológica aplicável por vontade política, mas como uma forma estatal histórica exigida pela dinâmica da acumulação integral. As formas de regularização criadas – como o ajuste fiscal, as políticas sociais paliativas, os investimentos em infraestrutura, a ampliação do crédito e a repressão às lutas sociais – expressam a tentativa de contenção do curso descendente da acumulação capitalista e da manutenção da hegemonia burguesa em meio ao ciclo descendente da acumulação capitalista e da desestabilização do regime de acumulação integral brasileiro. Concluímos que o neoliberalismo discricionário, emergente nos anos finais do período analisado, constitui uma exigência inerente à dinâmica histórica da fase de dissolução do regime de acumulação integral, cujos desdobramentos continuam a moldar de forma significativa a realidade social e econômica do Brasil contemporâneo.
Abstract: n this article, we analyze how contemporary Brazilian capitalism seeks to regularize itself through the neoliberal state, understood here as a fundamental historical form of the regulation of capitalist social relations, especially during the governments that held executive power in the Brazilian state between 2003 and 2016. Drawing on the Marxist theory of accumulation regimes and social classes, we aim to demonstrate that the neopopulist neoliberalism of the PT governments did not break with the foundations of the integral accumulation regime, but rather deepened them, assuming forms compatible with its phase of destabilization. We argue that neoliberalism should not be understood as a model or ideological recipe applied by political will, but as a historical state form required by the dynamics of integral accumulation. The regulatory mechanisms created—such as fiscal adjustment, palliative social policies, infrastructure investments, credit expansion, and repression of social struggles—express an attempt to contain the downward course of capitalist accumulation and to maintain bourgeois hegemony amid the downturn of capitalist accumulation and the destabilization of the Brazilian integral accumulation regime. We conclude that the discretionary neoliberalism emerging in the final years of the analyzed period constitutes an inherent requirement of the historical dynamics of the dissolution phase of the integral accumulation regime, whose developments continue to significantly shape the social and economic reality of contemporary Brazil.
Keywords: capitalist accumulation, forms of social regularization, social classes, discretionary neoliberalism
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